acma1953

lid geworden: 03-01-2011
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2 dagen geleden

Juízo Final

Como já aqui "bloguei" de há algum tempo para cá tenho lido Millôr Fernandes e em cada vez mais fico deliciado com os escritos dele. Faz bem à alma, ao humor. Costumo dizer aos amigos, personagens como ele deviam ser eternos pelo bem que fazem e pelas mensagens que transmitem.
Então aqui vai.

O Juízo Final

Chegou o miserável milionário no céu e, impacientemente, esperou a sua vez de ser julgado. Introduziram-no numa sala, noutra sala, noutra sala, até que se viu frente a uma luz ofuscante, na qual pouco a pouco foi distinguindo a figura santa do pai dos Homens. Em voz tronitoante este, tendo à direita, Pedro, e, à esquerda, uma figura que ele não conhecia, julgou sumariamente dois outros pecadores que estavam à sua frente. E, afinal, dirigiu-se a ele: 
- Que fez você de bom na sua vida ? 
- Bem, eu nasci, cresci, amei, casei, tive filhos, vivi. 
- Ora - disse o Senhor - isso são actos sociais e biológicos a que você estava destinado. Quero saber que bondade específica e determinada você teve para com o seu semelhante. 
- Bem - disse o milionário - eu criei indústrias, comprei fazendas, dei emprego a muita gente, melhorei as condições sociais de muita gente. 
- Não, isso não serve - disse o Todo-Poderoso - essas acções estavam implícitas ao acto de você enriquecer. Você as praticou porque precisava viver melhor. Não foram intrinsecamente boas acções, desprendidas, não servem. 
O milionário escarafunchou o cérebro e não encontrou nada. Em verdade, passara uma vida egoísta, pensando apenas em si mesmo. Nunca o preocupara seu semelhante, nunca olhara para o ser humano a seu lado senão como uma fonte de lucro para as suas indústrias. Mas, de repente, lemboru-se das obras de filantropia. 
- Ah - disse, puxando uma caderneta - aqui está. Uma vez dei cem cruzeiros para uma velhinha da Casa dos Artistas, outra vez contribuí com duzentos cruzeiros para o Hospital dos Alienados e outra vez contribuí com quinhentos cruzeiros para a Fundação das Operárias de Jesus. 
- Só ? - perguntou Deus. 
- Só - disse o milionário contrafeito. 
- Josué! - gritou o Todo-Poderoso -, dê oitocentos cruzeiros ao cavalheiro aqui e que vá para o Inferno. 


Moral: Amor com amor se paga e o dinheiro com dinheiro também

Millôr Fernandes, in "Pif-Paf" 

 https://www.youtube.com/watch?v=DtgtFp2FxN4